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Os dois mundos – A alegoria da caverna de Platão
Hoje transcrevo parte do livro “A República” escrito por Platão da Guimarães Editores, vol. VII, pp.10-17. Platão que nasceu no ano 427a.C. e morreu no ano 347a.C.:
“(...) - Depois disto – continuei – imagina tu, Glauco, a nossa natureza, segundo é ou não esclarecida pela cultura em comparação com uma situação tal como esta: imagina homens que vivem numa morada subterrânea em forma de caverna, cuja entrada está aberta à luz a todo o comprimento. Eles encontram-se ali desde a infância, com as pernas e o pescoço presos por correntes, de tal maneira que não podem mudar de posição, nem ver senão o que está à sua frente, pois as cadeias que os prendem impedem-nos de virar a cabeça. Por detrás deles brilha, vinda de longe e do alto, a luz de um fogo. Entre esse fogo e os prisioneiros supõe uma ladeira íngreme, ao longo da qual foi construído um pequeno muro, semelhante ao tabique que os exibidores de fantoches colocam entre eles e o público e acima do qual mostram as suas atracções.
- Estou a ver.
- Imagina, então, ao longo desse pequeno muro, homens transportando objectos de toda a espécie e de todas as formas – figuras de homens e de animais, de pedra ou de madeira – que o ultrapassam; como é natural, entre esses carregadores alguns falam e outros passam em silêncio.
- Que estranho quadro e que estranhos prisioneiros!
- Eles assemelham-se-nos. Acreditas que esses homens, nesta situação, não têm de si próprios e uns dos outros, senão a visão das sombras que o fogo faz projectar sobre a parte da caverna que lhes fica em frente?
- Como poderia ser de outra maneira, se são forçados, toda a vida, a conservar a cabeça imóvel?
- E com os objectos que desfilam não acontece o mesmo?
- Sem dúvida!
- Por consequência, se eles conseguissem falar entre si, não te parece que julgariam nomear os objectos reais ao nomearem as sombras que vissem?
- Com certeza.
- E se, além disso, houvesse um eco que projectasse os sons da parede do fundo da prisão; não é verdade que, todas as vezes que um daqueles que passam ao longo do muro falasse, eles tomariam a sua voz pela sombra que desfilasse?
- Sim.
- É indubitável que, para homens em tais condições, a realidade não seria mais do que as sombras projectadas pelos objectos fabricados.
- Forçosamente.
- Supõe, então, como eles reagiriam se fossem libertados das suas correntes e curados da sua ignorância e se as coisas se passassem assim: que se liberte um desses prisioneiros, que o forcem subitamente a erguer-se, a voltar o pescoço, a andar, a olhar para a luz; tudo isso o fará sofrer e, ofuscado pela claridade, não será capaz de olhar os objectos de que há pouco apenas via sombras. Pergunto-te: que poderá ele responder se lhe disserem que tudo quanto vira, eram apenas vãs aparências, mas que agora, mais perto da realidade e voltado para objectos mais reais, ele vê de maneira mais certa? Se, por fim, lhe mostrassem cada um dos objectos que desfilavam diante dele e o obrigassem, à força de perguntas, a dizer o que eram, não te parece que ficaria embaraçado e que as sombras que via antes lhe pareciam mais verdadeiras do que os objectos que lhe mostravam agora?
- Muito mais verdadeiras.
- E se o forçassem a olhar a própria luz, não te parece que os seus olhos ficariam doridos e que se esquivaria e se voltaria para as coisas que podia olhar e lhes atribuiria maior realidade do que àquelas que lhe mostravam?
- Sim.
- E se o arrancassem da caverna e o fizessem subir a escarpada encosta e o não largassem senão depois de o terem arrastado para a luz do sol; não pensas que ele sofreria e se revoltaria de ser assim arrastado e que, uma vez em plena luz do dia, ficaria deslumbrado pela claridade, incapaz de ver um só dos objectos que lhe apresentassem como verdadeiros?
- Seria incapaz, pelo menos de momento.
- Com efeito, deveria habituar-se até chegar a ver os objectos que se encontram no mundo superior. Primeiro, distinguiria mais facilmente as sombras, depois as imagens dos homens e dos outros objectos reflectidos nas águas e só então os próprios objectos. Depois disso, elevando o olhar para a luz dos astros e da lua, contemplaria, durante a noite, os corpos celestes e o próprio firmamento mais facilmente do que, durante o dia, o sol e o seu brilho.
- Sem dúvida.
- Por fim, penso, seria capaz de olhar e contemplar o sol no seu próprio lugar tal como ele é e não a sua imagem reflectida nas águas ou em qualquer outro local.
- Com certeza.
- Então, concluiria a respeito do sol que ele é que produz as estações e os anos, que governa tudo no mundo visível e que é, de certo modo, a causa de tudo quanto ele e os seus companheiros viam na caverna.
- É evidente que chegaria a essa conclusão depois das suas experiências.
- Se, em seguida, se lembrasse da sua primeira morada e do conhecimento que ele e os seus companheiros ali possuíam, não te parece que se regozijaria com a mudança e que os lastimaria?
- Decerto.
- Quanto às honras e aos elogios que podiam então conceder-se mutuamente e às recompensas dadas àquele que distinguisse da maneira mais penetrante os objectos que passavam, que lembrasse mais exactamente os que passaram regularmente, em primeiro ou em último lugar, ou em conjunto e que assim fosse o mais hábil a adivinhar o que viria em seguida, pensas tu que esse homem teria inveja e ciúmes daqueles que entre os prisioneiros, tivessem essas honras e poder? Não pensaria ele como Aquiles em Homero e não preferiria cem vezes «ser apenas um moço de charrua ao serviço de um pobre camponês» e suportar todos os males a voltar às suas antigas ilusões e a viver como vivia?
- Sou da tua opinião, preferiria tudo sofrer a reviver aquela vida.
- Imagina ainda, se o nosso homem tornasse a descer à caverna e retomasse o seu antigo lugar; não ficaria ele ofuscado pelas trevas, vindo bruscamente da luz para a escuridão?
- Com certeza!
- E se tivesse de novo de discriminar as antigas sombras e discuti-las com os prisioneiros que nunca deixaram as suas cadeias, enquanto a sua vista estivesse ainda confusa e antes que os seus olhos se tivessem acostumado à escuridão, o que levaria um certo tempo, não seria ele motivo de troça? Não diriam os outros que, por ter ascendido às alturas, tinha vindo com os olhos alterados e que não merecia a pena a ascensão? E se alguém tentasse libertá-los e conduzi-los para o alto, não te parece que se pudessem agarrá-lo e matá-lo, o fariam?
- Certamente que o matariam.
- Agora é preciso, meu caro Glauco, aplicar exactamente esta imagem àquilo que dissemos; é preciso identificar o mundo visível com a estada na prisão e a luz do fogo que a iluminava com o efeito do sol. Quanto à subida para o mundo superior e à contemplação das suas maravilhas, vê tu aí a ascensão da alma para o mundo inteligível e não te enganarás sobre o meu pensamento, já que desejas conhecê-lo. Deus sabe que ele é verdadeiro! Em todo o caso, é minha opinião que nos últimos limites do mundo inteligível está a ideia do Bem, que a custo apercebemos, mas que não podemos apreender sem concluir que ela é a causa universal de tudo o que há de bom e de belo; que no mundo visível foi ela que criou e espalha a luz que no mundo inteligível é a causa da verdade e da inteligência e que é preciso vê-la para que se proceda com sageza, quer na vida privada, quer na vida pública.
- Sou da mesma opinião, tanto quanto posso seguir o teu pensamento.
- Pois bem, sê ainda da minha opinião sobre este ponto: não é de admirar que aqueles que se elevaram até ela não estejam mais dispostos a interessar-se pelos assuntos humanos e que as suas almas aspirem, sem cessar, a conservar-se naquelas alturas; pelo contrário, é bem natural, se o relacionarmos com a nossa alegoria.
- Bem natural, com efeito.
- Mas, pensas que nos devemos admirar se alguém, passando dessas contemplações divinas às miseráveis realidades da vida humana, se sentir constrangido e mesmo ridículo quando, tendo a vista perturbada e não estando suficientemente habituado às trevas aonde acaba de cair, tiver de entrar em discussão nos tribunais ou em qualquer outro lugar, sobre as sombras e de combater as interpretações daqueles que nunca viram a justiça em si mesma?
- Não, não é de admirar.
- Se fôssemos sensatos, lembrar-nos-íamos de que os olhos são perturbados de duas maneiras e por duas causas opostas: pela passagem da luz para a escuridão e pela da escuridão para a luz. Então reflectindo que estes dois casos se aplicam também à alma, quando víssemos uma alma perturbada e impotente para discernir um objecto, em lugar de rirmos sem razão, examinaríamos se, ao sair de uma vida mais luminosa, ela fica, por falta de hábito, ofuscada pelas trevas ou se, vindo da ignorância à luz, ela ficará deslumbrada por um demasiado esplendor. No primeiro caso, devíamos felicitá-la pelo seu embaraço e pela maneira como empregou a sua vida; no segundo, lastimá-la-íamos e, se quiséssemos rir à sua custa, o riso seria menos ridículo do que o que recairia sobre a alma que desce da luz.
- Essa é uma distinção muito justa.
- É preciso, pois, se tudo isto é verdadeiro, tirar a seguinte conclusão: a educação não é aquilo que muitos proclamam. Pretendem, com efeito, depositar o saber na alma, onde ele não existe, como se se introduzisse a visão em olhos cegos.
- Com efeito, é o que pretendem.
- Ora as presentes considerações mostram que toda a alma possui em si mesma esta faculdade de adquirir conhecimento e um órgão próprio para isso e, assim como a vista não pode voltar-se da obscuridade para a luz, senão voltando todo o corpo ao mesmo tempo, também é com a alma toda que se deve desviar a visão das coisas perecíveis até que ela seja capaz de suportar a vista do ser e da parte mais luminosa do ser a que se chama Bem, não é verdade?
- Sim.
- A educação é a arte de orientar a visão da alma, da maneira mais fácil e mais eficaz. Não consiste em dar a visão ao órgão que já a possui, mas, como ele está mal orientado e não olha para onde deve, ela prepara a sua conversão.
- É o que parece.
- Agora podemos admitir que as outras faculdades, chamadas faculdades da alma, são análogas às do corpo, pois é certo que, quando faltam de início, pode-se adquiri-las em seguida, por meio do hábito e do exercício. Mas há uma, a faculdade de conhecer, que parece ter alguma coisa de divino e que não perde nunca o seu poder e que, conforme a orientação que lhe damos, se torna útil e vantajosa ou inútil e prejudicial. Não reparaste ainda, a propósito dos desonestos, mas espertalhões, como o seu miserável espírito é penetrante e distingue claramente as coisas para as quais se volta? Ele não tem pouca clarividência, mas põe-na ao serviço da sua desonestidade de modo que, quanto maior é a penetração do seu olhar, pior mal causará.
- Assim é, com efeito.
- E, no entanto, se desde a infância se agisse sobre a alma assim disposta pela natureza e se a desembaraçássemos de tudo o que, como massas de chumbo, a torna pesada e que é inato e que, ligado à alma pelos laços dos festins, dos prazeres e dos apetites deste género, a orienta para o que é inferior; se, desembaraçada desse peso, a orientássemos para a verdade, esta mesma alma, nos mesmos homens, veria a verdade com muito maior clareza, tal como vê as coisas para as quais está presentemente orientada.
- Assim é.
- Não é também verosímil e necessário, em consequência do que dissemos, que não são aptos para o governo do Estado nem aqueles que não têm educação e conhecimento da verdade, nem os que dedicam toda a sua vida ao estudo; uns porque não têm na sua vida nenhum ideal segundo o qual possam orientar os seus actos, particulares ou públicos, e os outros porque nunca acederão a ocupar-se disso, pois que se julgam já instalados nas ilhas da bem-aventurança?
- É verdade.”❐
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